MALDIÇÃO
Corrupção marca história de Rio Largo desde os anos 70
Município produziu primeiro prefeito e primeiro juiz condenados por desvio de recursos públicos
A cidade de Rio Largo tem sua história marcada por episódios de corrupção desde o início dos anos 70 e que se prolongaram até a gestão do ex-prefeito Gilberto Gonçalves, envolvido em vários processos de improbidade istrativa. O ranking maldito teve início na gestão de Mário Vaca, primeiro prefeito condenado por corrupção, seguido de vários outros gestores também afastados por desvio de recursos públicos.
Rio Largo também registra em seu histórico o caso do primeiro juiz aposentado compulsoriamente em Alagoas por desvio de conduta. Trata-se do ex-magistrado Gilvan Veloso, que se envolveu em um nebuloso processo judicial movido por Gilberto Gonçalves bem antes de GG entrar para a vida política.
Esse processo é um dos mais emblemáticos do Judiciário alagoano, com mais de duas décadas e ainda sem resolução definitiva, e deixou marcas na história política e judicial do estado. Trata-se de uma execução fiscal (n. 0016490-30.2004.8.02.0001), movida pela Fazenda Pública do Estado de Alagoas contra a empresa Eraldo Cavalcante & Cia. Ltda. e seus antigos sócios. Ainda em tramitação na 2ª Vara Cível de Rio Largo, o caso envolve diretamente Gilberto Gonçalves, empresário à época e posteriormente eleito deputado estadual e prefeito de Rio Largo.
O enredo tem início nos anos 1990, quando Gilberto Gonçalves adquiriu a franquia da cervejaria Antártica, que à época tinha uma dívida tributária considerada pequena. O ex-dono da distribuidora faleceu antes de transferir a firma para Gonçalves, que ou a explorar o negócio em nome de Eraldo Cavalcante & Cia até ser destituído da representação comercial.
Durante quatro anos, Gonçalves esteve à frente da operação e os débitos se acumularam, alcançando valores muito superiores aos originais.
Em vez de quitar os tributos devidos, Gonçalves teria recorrido a uma manobra jurídica e a empresa ou de devedora a credora do Estado. Alegando que pagou mais ICMS do que o devido, a empresa acionou a Justiça para cobrar R$ 3 milhões da Sefaz.
Nesse contexto, entrou em cena o juiz Gilvan Veloso, que acolheu a tese e concedeu liminar determinando o bloqueio imediato do valor nas contas do Estado. A decisão foi proferida durante o recesso do Judiciário, o que impossibilitou a apresentação de defesa pela Fazenda Pública. Embora a liminar tenha sido posteriormente suspensa, Gilberto Gonçalves já havia sacado R$ 300 mil do Banco do Brasil — único valor disponível na agência do banco.
A gravidade da situação levou o então governador Ronaldo Lessa (PSB, hoje PDT) a denunciar o caso ao Supremo Tribunal Federal (STF) e à Corregedoria Geral de Justiça de Alagoas. A apuração concluiu pela atuação irregular do magistrado, resultando em sua aposentadoria compulsória — a primeira por corrupção no estado.
Após o falecimento do fundador da empresa, Eraldo Cavalcante, os herdeiros — filhos e genros — tentaram se desvincular da dívida tributária, alegando que a empresa já havia sido transferida. A Justiça, porém, rejeitou o argumento por falta de provas sobre a sucessão empresarial. Em decisão de 2010, o juiz Manoel Cavalcante de Lima Neto manteve os nomes dos herdeiros no polo ivo e os condenou ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios.
O caso também gerou um conflito de competência entre a Justiça de Recife e a de Rio Largo. Enquanto uma decisão limitava o fornecimento de produtos à empresa, outra garantia o fornecimento sem restrições. O ime foi resolvido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), no Conflito de Competência nº 27.232/PE, que reconheceu a competência da 2ª Vara de Rio Largo, onde a primeira citação válida havia ocorrido em 1998.
Após anos de tramitação, o processo foi definitivamente remetido a Rio Largo em 2019, onde permanece ativo. Em maio de 2025, foram expedidos novos mandados. Após o escândalo no Judiciário, Gilberto Gonçalves, por sua vez, continuou sua trajetória política. Foi eleito prefeito de Rio Largo, cidade onde ocorreu a operação suspeita, e também exerceu mandato como deputado estadual. Ao longo da vida pública, voltou a ser alvo de investigações e chegou a ser preso por corrupção envolvendo contratos municipais.
CICLO VICIOSO
Rio Largo foi o primeiro município de Alagoas a ter um prefeito cassado por corrupção, inaugurando um ciclo de gestores presos por desvio de recursos públicos. O primeiro caso envolveu Mário Francisco da Silva, o Mário Vaca, ex-presidente da Câmara de Vereadores e eleito prefeito na década de 1970. Cercado de assessores sem escrúpulos, Mário acabou cassado e preso por uma série de irregularidades.
Na década de 1980, o município ou a ser istrado por Antônio Lins, o Tonhão, em um período marcado pela seriedade. No entanto, a tradição política da família foi abalada anos depois, quando seu filho, Toninho Lins, também eleito prefeito, se envolveu em escândalos durante os anos 2010. O ciclo se completa nos dias atuais, sob a gestão de Gilberto Gonçalves encerrada no ano ado.